sábado, 24 de janeiro de 2009

ENTRE CONFETES E SERPENTINAS, O CARNAVAL DE PERNAMBUCO É DEMAIS!

Maracatu Leão Formoso
Maracatu Rural fundado em 1980, Nazerá da Mata

ENTRE CONFETES E SERPENTINAS,
O CARNAVAL DE PERNAMBUCO É DEMAIS!

Thelma Regina Siqueira Linhares (*)


Algumas características no carnaval de Pernambuco são inquestionáveis: a alegria e a
irreverência do folião, a duração da festa, que ultrapassa o tradicional tríduo momesco e a multiculturalidade das manifestações desse ciclo. Igualmente, unanimidade: Pernambuco é a terra do frevo e do maracatu, é a pátria dos bonecos gigantes e dos papangus, tem o maior bloco de rua do mundo e o maior carnaval participativo, entre outras peculiaridades. Apenas, quando se questiona preferências, é que as divergências aparecem. Qual o melhor carnaval – o de hoje ou o do passado? Qual o melhor frevo de todos os tempos? Qual o bloco mais animado? Quem mais compôs músicas de carnaval? Qual o mais animado ritmo carnavalesco? Difíceis conclusões. Isso acontece porque gosto não se discute... afinal, o que seria do vermelho se todos gostassem do amarelo? O importante é viver o carnaval na paz, sem excessos e violências, com responsabilidades porque, antes de 365 dias, novo carnaval de novo!... para alegria dos foliões e folionas, que para essas terras migram.

Para conhecer ou reviver o carnaval de Pernambuco é interessante um breve passeio na História, antes mesmo do formato pelo qual entendemos carnaval hoje. Povos antigos festejavam seus deuses com músicas, bebidas e luxúrias. Eram rituais que reverenciavam a terra e sua fertilidade, celebravam a volta da primavera, comemoravam vitórias guerreiras e conquistas de povos. Muitas vezes, estavam associadas a fenômenos astronômicos e a ciclos naturais. Grécia, Roma e Egito, apenas para citar as grandes civilizações da Antiguidade, tinham os seus rituais e festejos comemorativos. Na Era Cristã, a Igreja Católica, deu nova formatação aos antigos rituais pagãos, fazendo-os coincidir com datas predeterminadas do seu calendário, na tentativa de punir abusos, moralizar costumes e difundir a fé cristã. As comemorações começavam, então, no ciclo natalino e terminavam, exatamente, na Quarta-feira de Cinzas, quando iniciava a Quaresma - período de quarenta dias de dor e jejum em preparação à Semana-Santa e à Páscoa. Na época das Grandes Navegações, com a conquista e expansão européia nos continentes americano e africano, o carnaval, mais precisamente, o entrudo, também, foi importado, imposto e, depois aculturado pelos povos pagãos conquistados.

No Brasil, o que seria o Carnaval chegou como entrudo, herança portuguesa, desde os primórdios da colonização. Festa violenta e de muitos excessos e atrocidades. Verdadeira selvageria e barbárie, onde o encontro de grupos rivais terminava sempre em brigas, ferimentos e mortes. No período colonial, as Capitanias Hereditárias que deram certo - Pernambuco e São Vicente (São Paulo) - podem ser consideradas como os pólos nascedouros do entrudo brasileiro. Depois, a Bahia - primeira capital da colônia - e o Rio de Janeiro, capital escolhida para sede do governo da família real no Brasil e, posteriormente, capital do Brasil-Império e República (até 1960) difundiram as manifestações culturais da época. Por um longo espaço de tempo, o Rio de Janeiro monopolizou o carnaval brasileiro, ditando moda em termos de fantasias e concursos, marchinhas carnavalescas e difusão do samba. O desfile das Escolas de Samba, naquele Estado, é um mega espetáculo, tipo exportação e, há décadas, desperta interesse dos diferentes meios de comunicações de massa. Também, verdade, que hoje, o carnaval apresenta várias faces e pólos de animação, que, difundido pela mídia e explorado pelo turismo interno e externo, trata-se, com certeza, de uma das mais fortes referências de Brasil e de brasilidade.
Foi no século XIX, que o entrudo passou a ganhar mais espaço no Brasil, coincidindo com seu declínio na Europa. Os escravos, molhados, jogavam, entre si, ovos, laranja podre, farinha, restos de comida. As famílias brancas, se divertiam jogando água suja e até xixi nos passantes. Os ricos se divertiam em locais fechados, sob a influência direta da moda ditada na corte. A violência, praticados por muitos e independente da classe social, era intensificada no período. A repressão policial era forte na expectativa de coibir os excessos. Muitas manifestações populares eram consideradas marginais ou ficavam na clandestinidade. Aos poucos, o entrudo foi se modificando, se civilizando. Novos feitios e comemorações foram sendo incorporadas. As pequenas e grandes invenções dos séculos XIX e XX foram transportadas para as festas de Momo, contribuindo para tornar o carnaval no que conhecemos hoje, o ciclo de festejos e comemorações mais popular entre os próprios brasileiros e mais divulgado no estrangeiro. Bailes de máscaras a partir de 1840. Limões de cheiro (pequenas bolas de cera cheias de água perfumada) e frascos de borrachas cheias de vinho, groselha ou vinagre, precursores dos lança-perfume, esses introduzidos em 1885. O corso, correspondendo aos desfiles de carros alegóricos puxados a cavalos (charretes, cabriolés e aranhas) e que se popularizou a partir de 1889, antes mesmo do surgimento do automóvel. A modinha Ô Abre Alas, de Chiquinha Gonzaga e que foi registrada, oficialmente em 1889, como a primeira música carnavalesca, literalmente, abriu espaço para os diferentes ritmos e canções carnavalescas. O surgimento e evolução dos meios de comunicações de massa (o rádio, as gravações em discos, as transmissões televisivas, a internet e o celular, juntamente com a invenção e modernização dos meios de transportes coletivos, encurtaram cada vez mais as distâncias e facilitaram a ida e vinda dos foliões dos quatro cantos da Terra, permitindo que o planeta seja uma aldeia global, também na folia.

O carnaval de Pernambuco recebeu todas essas influências históricas, culturais e sociais personalizado-as. É multicultural. A pluralidade, valorizando ainda mais o carnaval nessas terras do Leão do Norte, tem a diversidade cultural costurada pela alegria e animação, sendo possível observar a miscigenação das raças formadoras do povo brasileiro e, aqui e ali, uma pitada de novas influências refletidas nos ritmos, danças, agremiações, blocos, culinária e bebida típicas.

“Quem é de fato, bom pernambucano
Espera um ano pra cair na brincadeira.
Esquece tudo quando cai no frevo
E no melhor da festa
Chega a quarta feira.”


A palavra frevo vem de ferver, “frever”, na pronúncia simples do povo, para o significado de fervura, efervescência, agitação - adjetivos para os foliões que se juntavam nas primeiras agremiações e pipocavam ao som das bandas de músicas que tocavam dobrados, polcas, marchinhas até surgir o frevo propriamente dito, enquanto gênero musical. O frevo é dança e é música, genuinamente pernambucano. A coreografia da dança recebe o nome de passo e é muito variada: parafuso, saci-pererê, boneco de Olinda, tesoura, saca-rolha, do caroá, etc. Passista, independente do gênero, é quem dança, em geral, acompanhado pela pequena e colorida sombrinha de frevo, que ajuda a manter o equilíbrio. Nos tempos do entrudo, o passista era um capoeirista, que jogava capoeira abrindo caminho - alas - para o frevo passar e protegendo os músicos da multidão que frevava frenética. O nome frevo foi adotado no início do século XX, mas foi na década de 30, que se definiram as três principais modalidades de frevo: Frevo-de-Bloco (cuja origem está ligada às antigas serenatas, sendo acompanhado por uma orquestra de Pau e Corda), Frevo-Canção (que apresenta uma introdução forte, à base de metais, seguida da canção) e Frevo-de-Rua (somente instrumental, predominando os metais). A presença da orquestra é essencial para a execução do frevo e o compositor de frevo tem de ser músico ou ter parceria ao escrever a pauta musical, pois, ao compor, tem que definir o que cabe a cada seção instrumental de uma orquestra ou banda. Inspiração e poesia, nesse caso, não é suficiente...

Vivenciar o carnaval de Pernambuco, experimentando todos os seus ritmos, danças e cores, talvez seja o maior desafio que o folião de fôlego enfrenta. Como já citado, o carnaval aqui é plural, multicultural. E onde quer que se vá - Litoral, Zona da Mata, Agreste ou Sertão - a alegria será uma constante e a saudade, em breve, uma doce lembrança.

“Na madrugada do terceiro dia
Chega a tristeza e
Vai embora a alegria
Os foliões vão regressando
E o nosso frevo, diz adeus a folia...
... A gente sente uma saudade sem igual
Que só termina
Com um novo carnaval.”



RECIFE
Atualmente, o que mais caracteriza o carnaval da capital pernambucana é uma tríade de manifestações: o frevo, o maracatu nação e o maracatu rural. A essa pluralidade de ritmos, músicas e danças acrescentam-se blocos, caboclinhos, tribos de índios, a la ursa, bois e ursos de carnaval e escolas de samba. Além de refletir a dinâmica dos costumes, valores e modismos, o carnaval se reinventa e se recria num ritmo próprio. Assim, já se foi a época dos bailes nos principais clubes sociais, onde o folião se esbaldava em quatro noites de folias, manhãs de sol e matinês para a garotada, sob a batuta dos maestros famosos que comandavam orquestras ao som de frevo, cirandas, sambas e marchinhas de carnaval. Os bailes, hoje, restringem-se a algumas prévias carnavalescas, destacando-se, em 2006, o 58º Bal-Masquê, o 42º Baile Municipal e o 28º Baile dos Artistas, onde a tradição dos concursos de máscaras e fantasias é mantida.

“Ei pessoal, vem moçada
Carnaval começa no Galo da Madrugada. (BIS)
A manhã já vem surgindo,
O sol clareia a cidade com seus raios de cristal
E o Galo da Madrugada, já está na rua, saldando o Carnaval”

Mas, é o Clube de Máscaras Galo da Madrugada que fez seu primeiro desfile em 1978, para reviver os carnavais do passado, que se tornou a expressão maior do carnaval de Recife. A agremiação, que mantém o título de maior bloco de rua no Guinness Book há mais de uma década, literalmente, invade as principais ruas e pontes do centro da cidade, no sábado de Zé Pereira, arrastando uma multidão de milhares de foliões, brincantes, simpatizantes ou trabalhadores do carnaval, ao som de freviocas, orquestras de frevo e trios elétricos tocando, exclusivamente, os ritmos de Pernambuco. Inclusive, as águas da bacia do rio Capibaribe servem de passarela para o bloco A Galinha D’Água que acrescenta mais beleza ao desfile anual do Galo da Madrugada.

“É da coroa imperial
É maracatu
Ele é da casa real.”

Os Maracatus de Baque Virado ou Maracatu Nação, cujas origens remontam às tradições de coroação dos reis de Congo e Angola, foram descritos desde o início do século XVIII. É a expressão mais forte do sincretismo religioso e cultural entre o branco dominador e o negro escravizado. O Rei e a Rainha, ricamente vestidos e coroados, são protegidos por um grande pálio, segurado por um Escravo, que o faz girar, simbolizando o movimento da Terra. Acompanhando-os há as Damas do Paço, algumas segurando as Calungas, que são bonecas de origem religiosa. Outras figuras da corte aparecem: Príncipe, Princesa, Duque, Duquesa, Embaixador e Baianas. Às vezes, incluem Caboclo de Pena (representando o índio brasileiro) e Meninos Lanceiros vestidos como guardas romanos. A orquestra do Maracatu Nação é composta por instrumentos de percussão (alfaias, zabumbas, taróis, caixas, ganzás, etc.) que tocam num ritmo compassado, que vai acelerando, enquanto uma corneta ou clarim anuncia a apresentação do Estandarte. A coreografia do Maracatu Nação é típica, com movimentos de mãos e braços acompanhando os batuques da percussão. A Noite dos Tambores Silenciosos acontece na segunda-feira de carnaval, em frente à Igreja do Pátio do Terço, quando a percussão de todos os maracatus silencia, à meia-noite, em reverência à Nossa Senhora do Rosário (padroeira dos negros) e a São Benedito, reforçando às origens afro-brasileiras do Maracatu de Baque Virado.

O Urso do Carnaval tem uma composição muito simples: o urso (um homem vestido por um velho macacão coberto de estopa que usa uma máscara feita de papel-machê) e o domador (que segura a corda que prende o urso). Dançam ao som de música própria ou de antigos sucessos do carnaval. Em geral, a orquestra de Urso de Carnaval é formada por sanfona, triângulo, ganzá, pandeiro e reco-reco. Pode haver um tesoureiro, que arrecada dinheiro entre os expectadores da folia.
Na versão infantil, a La Ursa é pura brincadeira. As crianças batem em latas e cantam o refrão em coro uníssono e animado. Felizes, conseguem apurar alguns reais no final da diversão.
“A la ursa quer dinheiro
Quem não dá é pirangueiro...”


O Boi do Carnaval é uma transformação do bumba-meu-boi do ciclo natalino. Com nova coreografia e colorido exuberante, algumas figuras são personagens populares do carnaval pernambucano: Bois, Burras, Cavalo Marinho, Mateus, Catirina e Babau comandados pelo capitão e tirador de loas trazem alegria e medo à criançada.

O Samba é outro ritmo do carnaval pernambucano e recebe influências do frevo, maracatu, capoeira e escolas de samba. Na década de 30, do século passado, aparecem as primeiras Escolas de Samba do Estado.

Os grupos de Afoxés são cada vez mais populares no carnaval de Pernambuco, embora venham perdendo as influências dos rituais do Candomblé. Seus integrantes, principalmente homens, passavam por uma preparação espiritual antes dos desfiles, o que já não acontece hoje. A presença da percussão (atabaques, agogôs e xerês) é essencial e
muitos cantos são na língua Nagô.

A programação oficial do carnaval do Recife, define vários pólos de animação, conforme a preferência do folião. No centro, destacam-se: Pólo Recife Multicultural (Marco Zero),
Pólo das Fantasias (Praça do Arsenal), Pólo Mangue (Cais da Alfândega), Pólo de Todos os Frevos (Avenida Guararapes), Pólo de Todos os Ritmos (Pátio de São Pedro), Pólo Afro (Pátio do Terço), Pólo das Agremiações (Av. Dantas Barreto), Pólo das Tradições (Pátio de Santa Cruz). Destacam-se, ainda, o carnaval nos bairros, nos chamados pólos descentralizados: Santo Amaro, Chão de Estrelas, Casa Amarela, Nova Descoberta, Alto
José do Pinho, Várzea, Ibura e Jardim São Paulo.


OLINDA
Distante do Recife 6 km, é o centro antigo da cidade que monopoliza o seu carnaval, no sobe e desce das ladeiras.

“Olinda esse meu canto
Foi inspirado em seu louvor
Entre confetes e serpentinas
Venho lhe oferecer
Com alegria o meu amor.
Olinda!
Quero cantar
A ti, esta canção
Teus coqueirais
O teu sol, o teu mar
Faz vibrar meu coração
De amor a sonhar
Minha Olinda sem igual
Salve o teu carnaval.”


A primeira capital do Estado ostenta os títulos de Patrimônio da Humanidade, de 1ª Capital Brasileira da Cultura e da Terra dos Bonecos Gigantes. Destaque para os inúmeros artistas plásticos e de artesanato que buscam inspiração ou residem na histórica cidade pernambucana. Nas ladeiras e no casario colonial sua sempre linda vista do horizonte atrai turistas o ano inteiro, particularmente no carnaval. E a partir da virada de um novo ano, já é carnaval em Olinda, quando prévias animadas de seus principais blocos e agremiações revezam-se nas semanas pré-carnavalescas. Destaque para o desfile das Virgens do Bairro Novo um dos primeiros blocos de homens travestidos. O Homem da Meia-Noite, fundado em 1932, abre oficialmente o carnaval olindense a zero hora do sábado de Zé Pereira. Considerado o pai dos gigantes, serviu de inspiração para o artista plástico Sílvio Botelho, que já criou centenas de bonecos gigantes, sendo, inclusive, o idealizador do Encontro de Bonecos Gigantes em Olinda, já tradição, que acontece na manhã da terça-feira, nas ladeiras de Olinda, reunindo todos os gigantes em desfile e arrastando milhares de foliões de todas as idades. Destaque para Marin dos Caetés, Vassourinhas, Pitombeira e Elefantes. O bloco do Bacalhau do Batata, há décadas, estica o carnaval para quarta-feira de cinzas para quem trabalha no período do tríduo momesco, sendo o pré-cursor do quero mais carnaval, que se espalha cada vez mais nos vários cantos do Brasil. Olinda, enfim, é a cidade que tem o maior carnaval participativo, que se organiza, irreverentemente, em inúmeros blocos, agremiações, grupos ou eu-sozinho. Basta querer. Os nomes dos blocos, troças e agremiações olindenses merecem destaque pela originalidade e irreverência.

“Tem mais que estar nessa
Fazendo misura na ponta do pé
Quando o frevo começa
Ninguém me segura.
Vem ver como é
O frevo madruga
Lá em São José
Depois em Olinda
Na praça do Jacaré
Bom demais, bom demais
Bom demais, bom demais
Menina vem depressa
Que esse frevo é bom demais.”



BEZERROS
Cidade distante do Recife cerca de 107 km e tem a BR 232 como via de acesso. É conhecida como a Terra dos Papangus. E, no domingo de carnaval, no centro da cidade e ao som de orquestras de frevo, acontece o grande encontro de centenas de papangus. A brincadeira surgiu no início do século XX, quando casados foliões fugiam de casa, escondidos pelas máscaras, para brincar o carnaval. Para manter as energias, comiam o angu (comida típica nordestina, à base de milho) na casa de amigos e parentes. Com o passar do tempo, o grupo de papangus foi aumentando, mas o segredo da identificação do folião foi preservado, se mantendo até hoje. Pessoas de todas as idades divulgam e mantém a tradição, muitas confeccionam sua próprias máscaras e Bezerros tem um motivo próprio na temática de seu artesanato.


ILHA DE ITAMARACÁ

“O mar estava tão belo
E um peixe amarelo eu vi navegar, navegar
Não era peixe não era
Era Iemanjá, Rainha
Dançando ciranda, ciranda
No meio do mar.”


A Ilha de Itamaracá fica distante do Recife 47 km e os acessos principais são pela BR 101 Norte, PE 35 e PE 15. A ponte sobre o Canal de Santa Cruz faz a ligação da ilha com o continente, através da cidade de Itapissuma. O referencial cultural da ilha pode ser considerado a ciranda, pois é a terra de Lia de Itamaracá. E, embora a Ciranda não seja típica do ciclo carnavalesco, a ele empresta seu ritmo e sua dança, sendo mais uma riqueza do carnaval de Pernambuco. Para dançar é só entrar na roda, dando-se as mãos. E, se a roda ficar muito grande, outra roda menor, imediata e sucessivamente é feita.


GOIANA
Distante do Recife 60 km, os principais acessos são pela BR 101 Norte, PE 15 e PE 01. Goiana está a aproximadamente 10 km da divisa de Pernambuco com a Paraíba. As suas principais manifestações carnavalescas são os caboclinhos e os maracatus rurais.
A origem indígena dos Caboclinhos ou Cabocolinhos é indiscutível. Está no figurino, onde penas multicoloridas são usadas em tangas e cocares, além de adereços diversos como colares, pulseiras, braçadeiras e tornozeleiras O grupo é formado por homens, mulheres e crianças com papéis definidos: cacique, mãe-da-tribo, pajé, matruá, porta-estandarte, perós (meninos e meninas), caboclos-de-baque, cordão de caboclos e de caboclas. Todos passam apressados, em filas, ao som das preacas (arco e flecha) e na exibição, contam, também, com um pequeno grupo de músicos, que toca inúbia (um pequeno flautim de taquara), caracaxá, tarol e surdo. A coreografia consiste em abaixar-se e levantar-se com agilidade, apoiando-se nas pontas dos pés e calcanhares, sob a marcação característica das preacas. Canindés e Carijós são as tribos de caboclinhos mais antigas de Pernambuco, ambas fundadas em1897.


NAZARÉ DA MATA
Cerca de 65 km separam o Recife e Nazaré da Mata - a Terra dos Maracatus Rurais - enquanto a BR 408 encurta a distância entre as duas cidades. O maior Encontro de Maracatus do Estado de Pernambuco acontece na segunda-feira de carnaval quando para Nazaré da Mata se dirigem grupos de outros municípios, lotando caminhões e ônibus ou realizando extensas caminhadas pelos canaviais da Zona da Mata.
Os Maracatus Rurais recebem outros nomes: Maracatus de Baque-Solto, Maracatus de Orquestra ou Maracatus de Trombone. Suas origens e histórias são ainda pouco conhecidas. Acredita-se que surgiram da fusão de folguedos diversos da cultura do interior do Estado, em especial, da zona canavieira e foi conquistando, gradativamente, espaço e status no carnaval pernambucano. Observa-se, ainda, um certo sincretismo religioso, quando homenagens aos orixás são feitas antes da saída dos grupos. A Boneca preta é calçada pela madrinha, isto é, consagrada e batizada com rezas e defumadores. Alguns Caboclos de Lança e de Pena desfilam atuados, isto é, protegidos pelas magias de cultos à Jurema e outras entidades afro-indígenas. O cravo branco ou vermelho, preso entre os dentes, simboliza esses rituais religiosos. O colorido das fantasias e dos adornos e o som produzidos dos chocalhos são os principais elementos visuais dos Maracatus Rurais. O personagem mais característico é o Caboclo de Lança, que tem o rosto pintado de urucum e segura uma lança de madeira torneada cuja ponta, aguda e comprida, tem cerca de 3O cm. Ele a segura com as duas mãos e a movimenta para cima, para baixo e para os lados, afastando a multidão, enquanto corre, salta e dança, num duelo imaginário. Usa um ceroulão (calça de chitão), a fofa (calça frouxa com franja por cima do ceroulão), meias de jogador, camisa de mangas compridas e de cor viva e uma grande gola toda bordada por milhares de lantejoulas e missangas, normalmente confeccionada por quem a usa. O surrão, armado por galhos, sustenta quatro ou cinco chocalhos e marca o ritmo e o andar do Caboclo de Lança. Um lenço amarrado à cabeça e, sobre ele, um chapéu de palha ornado de fitas de papel celofane, multicoloridas ou de uma única cor, muito vistoso e que dá leveza aos movimentos. Óculos escuros, um galho de arruda atrás da orelha e um cravo branco entre os dentes, completa o visual do Caboclo de Lança. Durante a exibição, o Maracatu Rural evolui, rapidamente, em círculos, onde os Caboclos de Lança correm por fora e as Baianas e Damas de Buquê dançam num outro, no interior. No centro ficam o Estandarte, a Boneca, o Rei, a Rainha e os Caboclos de Pena (Tuxáus). Um coro feminino acompanha a orquestra composta pela percussão (ganzá, tarol, cuíca, surdo e zabumba) e alguns instrumentos de sopro (gonguê, saxofone, corneta e trombone).


PESQUEIRA
Distante do Recife 209 km, tem a BR 232 como via de acesso. É conhecida como a Terra dos Caiporas, título que conquistou a partir de 1962, quando saiu o primeiro bloco carnavalesco de caiporas: homens, mulheres e crianças, vestindo terno e gravata e tendo um enorme saco de estopa na cabeça. O que era motivo de medo passou, assim, a ser motivo de alegria e brincadeira. Segundo a tradição, tochas sobrenaturais apareciam em cima das árvores, assustando e pregando peças nos caçadores e seus cães. Para acalmar as assombrações (caiporas) e fazer boas caçadas, muitos deixavam fumo e cachaça nos troncos das árvores, alimentando a lenda.


VITÓRIA DE SANTO-ANTÃO
Cidade que fica 51 km de distância do Recife e tem o acesso pela BR 232. O que caracteriza seu carnaval, que reúne mais de cem agremiações, é a rivalidade alimentada entre seus clubes, que desfilam carros alegóricos, apresentam fantasias luxuosas e realizam bailes. Os dois principais clubes (O Camelo e O Leão) mobilizam preferências de integrantes e moradores da cidade, que agem como torcedores fanáticos, especialmente no domingo e na terça-feira de carnaval, quando há os principais desfiles.


TRIUNFO
Localizada no sertão pernambucano, Triunfo fica a 402 km de distância do Recife. A BR 365 e a BR 232 são as principais vias de acesso. Os Caretas são responsáveis pela originalidade do carnaval naquela cidade. Fantasiados e mascarados, de todas as idades, usam chicotes que fazem estalar no ar. Anualmente é realizado concurso que elege o Careta mais bem caracterizado.


ABREU E LIMA
Fazendo parte do Grande Recife, fica 20 km de distância da capital. As vias de acessos são
a BR 101 Norte, a PE 15 e a BR 408. Além dos maracatus rurais e das cirandas, destacam-se as Rodas de Coco, que cada vez mais se incorporam aos festejos carnavalescos.

“Ninguém pode resistir
O frevo desses que faz,
Demais a gente se distinguir
Deixe o frevo rolar
Eu só quero saber
Se você vai brincar
Ah! meu bem sem você
Não há carnaval
Vamos cair no passo e a vida gozar.”



E quem quer curtir sol, céu e mar e, ainda, brincar carnaval dos bem animados, muitas outras opções há, ao norte ou ao sul do Recife, em pleno Litoral pernambucano.

(Litoral Norte)
PAULISTA
Distante do Recife 15 km, tem por principais acessos a PE 15 e PE 01. Suas principais praias são: Janga, Pau Amarelo, Nossa Senhora do Ó, Conceição e Marinha Farinha.


IGARASSU
Distante do Recife 26 km, as vias de acessos são: BR 101 Norte, PE 15 e PE 01.


ITAPISSUMA
Distante do Recife 36 km, tem a BR 101 Norte como principal via de acesso.

(Litoral Sul)
JABOATÃO DOS GUARARAPES
Distante do Recife 18 km e acessos por ruas e avenidas do Recife. Piedade, Candeias e Barra de Jangada são suas principais praias.


CABO DE SANTO AGOSTINHO
Distante 41 km do Recife tem acesso pela BR 101 Sul e pela PE 07. Possui belas praias entre elas: do Paiva, Itapuama, Pedra do Xaréu, Enseada dos Corais, Gaibu, Paraíso, Calhetas e Suape.


IPOJUCA
Distante do Recife 57 km, tem a PE 60 e a BR 101 Sul, como as principais vias de acesso.
Suas principais praias - Porto de Galinhas, Muro Alto, Maracaípe e Serrambi - cada vez mais se firmam no cenário turístico nacional e internacional, pela beleza de suas paisagens naturais, destaque na mídia, status dos turistas, investimentos realizados e eventos náuticos promovidos.


TAMANDARÉ
Distante da capital pernambucana 114 km, tem a PE 60 como via de acesso.


SÃO JOSÉ DA COROA GRANDE
Distante do Recife 124 km, as principais vias de acesso são PE 60 e BR 101 Sul.


Na Região Metropolitana do Grande Recife, o carnaval é também criativo e multicultural, pois é comum a participação de grupos e agremiações visitantes ou contratadas para shows, durante o período das folias de momo.

CAMARAGIBE
Distante do Recife 10 km. Acessos pela BR 408 e avenidas do Recife.


A Zona da Mata, juntamente com o Litoral, ocupa 11% do território do Estado. Nos dias de momo, animação, originalidade e todos os ritmos do carnaval de Pernambuco dão colorido especial ao ciclo carnavalesco nas cidades que, oficialmente, não fazem parte do roteiro da folia. Opção a mais para seus moradores e aqueles que preferem dias mais tranqüilos e longe da rotina do cotidiano.

MORENO
Distante da capital: 28 km. Acessos pela BR 232 e PE 07. Além da paisagem da Zona da Mata, o frevo e maracatu rural são tradições no carnaval de Moreno.


A Zona do Agreste totaliza 19% do Estado e os festejos do carnaval fazem parte da cultura, embora o ciclo junino é que mobilize as preferências e dinamize o turismo e a economia locais. Essa zona natural do espaço geográfico pernambucano oferece paisagens de brejos e caatingas, clima tropical sub-úmido e economia baseada na atividade agro-pecuária.

CARUARU
Distante do Recife 130 km, tem o acesso pela BR 232.


GARANHUNS
Distante 228 km do Recife, tem acesso pela BR 232, BR 104, PE 117, PE 126 e BR 423.


O Sertão representa 70% do território pernambucano, predominando clima tropical semi-árido, chuvas escassas e vegetação de caatinga.

ARCOVERDE
Distante do Recife 252 km, tem acesso pela BR-232.
Arcoverde tem uma variedade de manifestações culturais destacando-se Samba de Coco, Literatura de Cordel, Bois e Forró. Alguns grupos e artistas de lá têm projeção nacional e, no carnaval, exercem influências.


PETROLINA
Distante do Recife 714 km. Os acessos são pela BR 232, BR 122, BR 428 e BR 116.

Finalizando este artigo, os versos de mais um frevo pernambucano, que traduzem a filosofia de vida do povo daqui, afinal, entre confetes e serpentinas o carnaval de Pernambuco é demais!

“Quando a vida é boa
Não precisa pressa
Até quarta-feira
A pisada é essa
Prá que vida melhor
Fale quem tiver boca
Eu nunca vi coisa assim
Oh que gente tão louca”


(*) Professora e pesquisadora de Folclore.
thelmalinhares@bol.com.br
Recife, fevereiro de 2006

sábado, 17 de janeiro de 2009

É CARNAVAL DE PERNAMBUCO


É CARNAVAL DE PERNAMBUCO
Thelma Regina Siqueira Linhares

O carnaval de Pernambuco continua sendo um dos mais festejados, animados e tradicionais do Brasil. Seu calendário, com certeza, se antecipa e se estende, muito além, do tríduo momesco. Alguns elementos já não são vivenciados, como por exemplo, o corso, o mela-mela, as batalhas de confetes e serpentinas. Outros, já sem a força que exerciam há algumas décadas, como os bailes dos clubes sociais e as fantasias luxuosas. Enquanto características novas vão sendo incorporadas e assimiladas como as fantasias simples compradas no camelô, os abadás e as camisetas que passam a compor o visual do folião de hoje. Este, sim, mantém a alegria, a irreverência e a extravagância de todas as épocas.

Várias cidades pernambucanas são consideradas pólos carnavalescos, apresentando peculiaridades nos festejos de Momo, destacando-se entre elas:
Recife – terra do frevo, do maracatu de baque-virado e dos caboclinhos;
Olinda – terra do frevo e dos bonecos gigantes;
Nazaré da Mata – terra do maracatu rural e
Bezerros – terra do papangu.

“Ei pessoal!
Vem moçada
Carnaval começa
No Galo da Madrugada!”

No sábado gordo de zé-pereira, as ruas do centro comercial do Recife são, literalmente, tomadas pelos foliões do Galo da Madrugada. Milhares de foliões. Comprovadamente, a maior agremiação carnavalesca do Planeta – conforme inclusão no Guiness Book. Esse destaque foi registrado em 1995 e vem se mantendo e batendo recordes desde então.
O Clube de Máscaras Galo da Madrugada fez seu primeiro desfile em 1978, para reviver os carnavais do passado e, ano a ano, vem crescendo e empolgando os foliões dos quatro cantos da Terra. No seu desfile oficial, os foliões resgatam as fantasias, muitas delas inspiradas nos modelos dos carnavais de outrora: palhaços, pierrots, colombinas, almas, havaianas, odaliscas e árabes. Além desses, o povo é parte integrante do bloco. Fantasiado ou não, usando camisetas alusivas ao Galo da Madrugada ou a blocos seguidores (Rabo do Galo, Galinha da Madrugada, Franga da Noite entre outros), o povão canta, dança, bebe, sua e vibra, desde à concentração, ao amanhecer, até à dispersão, quando o sol já se pôs...
Acompanhando os foliões, os carros alegóricos e os trios elétricos, com orquestras de frevo pernambucano, com muito metal e instrumentos de cordas. As freviocas. Cantores pernambucanos e convidados revezam-se nas dezenas de trios elétricos que acompanham o Galo da Madrugada, todos comprometidos com os frevos de Pernambuco.
O desfile do Galo da Madrugada começa na Rua da Concórdia, que já foi o centro do carnaval recifense do início do século passado e toma as ruas circunvizinhas dos bairros de São José e Boa Vista, em mais de quatro quilômetros de euforia. O rio Capibaribe, inclusive, faz parte do cenário momesco, onde o bloco A Galinha D’água faz seu carnaval aquático, congregando dezenas de catamarães, iates e lanchas caracterizadas.
Três figuras gigantescas não podem ser esquecidas: O Galo, que adorna a congruência da Rua do Sol com a Av. Guararapes e um casal real – o Rei e a Rainha do maracatu – que empresta majestade às águas do Rio Capibaribe. E a paisagem recifense, tão bela e tão própria, com suas pontes e rio, se veste de fantasia, colorido e animação, de um mar de gente compromissada com a alegria.

“O frevo é quente
Alegria de toda essa gente
Contente
Com muito orgulho de lá!”

O frevo é um capítulo especial no carnaval de Pernambuco. Talvez o que mais personaliza o ciclo carnavalesco no Estado.
Suas origens musicais remontam a meados do século XIX, no repertório das bandas militares. Naquele tempo, a figura do capoeira, munido de bastão e que vinha abrindo alas entre as bandas militares, tornava o frevo uma luta, uma guerra. Com feridos e até mortos. Já o termo frevo vem da corruptela frever, como o povo iletrado assim falava ferver, como significado de rebuliço, efervescência e multidão.
Frevo de rua (só instrumental). Frevo canção (com introdução orquestral). Frevo de bloco (executado por orquestras de pau e corda). Música e dança. Passista é quem dança, quem faz as coreografias do frevo. Dança individual, criativa. Com muitos passos já catalogados e ensinados, principalmente por Mestre Nascimento do Passo e pela garota Safira, representante da novíssima geração de passistas. Saca-rolha, parafuso, tesoura, corta jaca, dobradiça, ferrolho, boneco de Olinda são alguns exemplos desses passos consagrados. Mas não basta aprendê-los e copiá-los. A improvisação e criatividade estão sempre presentes num bom passista, que faz uso da sombrinha, pequena e colorida, que lhe permiti manter o equilíbrio nas manobras coreográficas da dança.

“É da coroa imperial
É maracatu
Ele é da casa real.”

As origens do maracatu nação ou de baque-virado remontam às referências de coroação dos reis de Congo e de Angola e são citadas em documentos do século XVII, em especial, nas festas religiosas católicas de N. Sra. dos Prazeres e N. Sra. do Rosário de Santo Antônio. Os reis negros, compareciam àquelas solenidades, sob um grande pálio, ladeados por sua corte. A bandeira e instrumentos de percussão eram indispensáveis em tais cerimônias. E sob severa vigilância das autoridades religiosas e policiais. Em meados de 1850, já se usava o termo maracatu ou nação para designar reuniões de negros, ainda escravos. Os cortejos se faziam presentes, também no carnaval, inclusive com a boneca – a Calunga – um dos elementos sagrados do maracatu. O chefe temporal e espiritual era o babalorixá dos terreiros de nagô.
Hoje, os mais antigos maracatus de baque-virado continuam mantendo as tradições dos antepassados africanos, destacando-se entre elas, os maracatus: Nação do Elefante (1800), Nação do Leão Coroado (1863), Nação da Estrela Brilhante (1910), Nação Porto Rico (1915) e Nação Cambinda Estrela (1953).

Outra característica do carnaval pernambucano e relativa ao maracatu é a Noite dos Tambores Silenciosos, que acontece a zero hora da segunda-feira, no Pátio do Terço, em reverência à N. Sra. do Rosário dos Pretos, protetora dos negros, desde os tempos do Brasil-colônia. Os maracatus de baque-virado, com seus reis, rainhas, princesas, príncipes, toda a corte, enfim, e os grupos de afoxés realizam os rituais, anteriormente restritos aos seus integrantes e seguidores, mas que arrastam cada vez mais participantes e curiosos.

Os caboclinhos ou cabocolinhos expressam toda a influência indígena da miscegenação brasileira. A coreografia dos seus integrantes é marcada pelo som dos estalidos das preacas (arco e flecha), acompanhados por gaitas ou flautim, caracaxás, tarol e surdo. As principais figuras são rei (cacique), rainha (cacica), perós (indiozinhos), porta-estandartes, pajé, curandeiro, caboclinhos e caboclinhas. Vestindo tangas e cocar de penas, usam muitos adereços: colares, pulseiras e braçadeiras.

“A la ursa quer dinheiro
Quem não dé é pirangueiro...”

A la ursa é, principalmente, brincadeira de criança, que aproveita para juntar um dinheirinho. Cantando o refrão e batendo em latas, a meninada percorre a vizinhança, para fazer a coleta e aproveitar a farra. Em especial, nos bairros mais populares e da periferia das principais cidades pernambucanas.


“Eu quero ver este ano
A juventude dourada
Camisa aberta no peito
Pulando sem preconceito.”

Os bailes nos clubes sociais do Recife caíram de moda na última década do século XX, embora, algumas tentativas de popularizá-los, novamente, sejam feitas. Mas sem aquele brilho e glamor que lhes eram tão peculiares. As noites de folia nos salões dos Clubes Português, Internacional, Nautico, Sport e Santa Cruz e suas matinês (para a criançada) faziam os frevos de Capiba, Nélson Ferreira, João Santiago, Jota Miquiles e Alceu Valença, entre tantos, muito mais vibrantes ao som das orquestras famosas dos maestros da terra – Duda, Zé Menezes, Guerra Peixe, Super Ohara, Banda de Pau e Corda e Quinteto Violado. Naquela época, muitos cantores da MPB eram convidados para fazer os carnavais dos clubes. Jair Rodrigues, Beth Carvalho, Zé Kete, Noite Ilustrada e Moacir Franco eram os mais requisitados.


“Ao som dos clarins de momo
O povo aclama com todo ardor
E Elefante exaltando as suas tradições
E também seu esplendor”

Enquanto Recife, nas décadas passadas, se destacava pelo carnaval de clubes sociais e desfiles oficiais, Olinda vinha fazendo, em suas ladeiras estreitas, o autêntico carnaval de rua - participativo, criativo e irreverente. Suas agremiações tradicionais, nas décadas de 60, 70 e 80, desfilavam sem passarelas oficiais e ingressos cobrados, concentrando foliões de todas as partes. Elefante (no domingo), Pitombeiras dos Quatro Cantos (na segunda-feira), Vassourinhas (na terça-feira) e o Bacalhau na Vara (na quarta-feira, organizado por um garçon - o Batata - para que esses profissionais, também, pudessem brincar o carnaval, mesmo que tardiamente... talvez, tenha sido o ponto de partida para a resistência do carnaval brasileiro que, na última década do século XX, em algumas cidades, ultrapassa o feriado de Cinzas e o início da Quaresma.)
E multiplicam-se os novos blocos e troças. A cada ano, novas agremiações são criadas. Muitas vezes, basta o som de um piston, desafinado até, para arrastar a multidão... E nomes criativos, irreverentes e, às vezes, obscenos ficam consagrados: Ceroula, Eu acho é pouco, Siri na lata, A corda, A porta, Segura a coisa, Segura o cu, etc. Alguns têm a versão infantil, com dia próprio de desfile: Ceroulinha, Eu acho é pouquinho.


Os bonecos gigantes caracterizam o carnaval de Olinda. Há mais de meio-século surgiu o Homem da Meia-Noite (1932), um dos mais antigos e populares dos gigantes carnavalescos. E muitos outros vieram: A Mulher do Meio-Dia (que no carnaval de 1990 se casou com o Homem da Meia-Noite, numa cerimônia complicada, por causa do fuso horário dos noivos...), O Menino da Tarde, A Menina da Tarde, O Turista, O Camisão, O Guarda-Noturno, Jonh Travolta, O Barbapapa, etc. Muitos deles foram criados por Sílvio Botelho, que passou a ser considerado o pai dos bonecos gigantes, dando-lhes mais leveza. Com mais de três metros de altura e vinte quilos de peso, o carregador de um boneco gigante é, literalmente, as suas pernas, obrigando-o a “olhar, comer e beber pela braguilha das enormes calças”, como já foi citado por Olimpio Bonald Neto.
Na manhã da terça-feira há o encontro dos bonecos de Olinda, no bairro de Guadalupe, ocasião em que dezenas de gigantes se encontram para delírio dos foliões.


Um outro aspecto peculiar do carnaval da Marim dos Caetés são as fantasias. Extremamente simples e criativas fazem a alegria do folião olindense – traduza-se oriundo de qualquer recanto da Terra, pois os turistas são maioria naquela cidade pernambucana durante o carnaval. Brincando lado a lado com o lorde (fantasia incorporada por um morador olindense, há anos) estão o banho no box, o ônibus, a nega maluca, padre, anjo, enfermeira, o lalau, burrinhas, etc. E muita máscara pintada no rosto.


Em cidades da zona canavieira, Carpina, Tracunhaém, Timbaúba, Timbira, Igarassu, Goiana e, especialmente, Nazaré da Mata, destacam-se os maracatus rurais ou de baque solto. Há algumas décadas foram considerados “maracatus descaracterizados, degenerados, de 2ª categoria”, conforme registrou Roberto Câmara Benjamim. Foram até proibidos de desfilar em lugares oficiais pelos organizadores do carnaval recifense... Suas origens são desconhecidas e os mais antigos foram fundados há mais de oitenta anos. Percebe-se a influência de vários folguedos. Neles destacam-se as figuras sujas (Mateus, Catirina, Burra, Babau, Caçador), os caboclos de lança, os caboclos de pena, as baianas, o rei, a rainha, o valete e a dama (protegidos por um grande guarda-chuvas), mestre e os músicos.
A figura símbolo do maracatu rural é o caboclo de lança ou lanceiro, que veste um ceroulão (calça de chitão), a fofa (calça frouxa com franja por cima do ceroulão), meias de jogador, camisa mangas compridas e em cores vivas e a grande gola toda bordada por milhares de lantejoulas e missangas. O surrão, com quatro ou cinco chocalhos, armados por galhos e que marcam o ritmo e o andar do caboclo de lança. Um lenço amarrado à cabeça e, sobre ele, um chapéu de palha ornado de fitas multicoloridas ou de uma única cor, de papel celofane. Empunha uma lança com mais de dois metros, recoberta de fitas coloridas. Não pode faltar um óculos escuros, um cravo branco seguro entre os dentes e um galho de arruda atrás da orelha. Tudo para manter o corpo fechado, pois o caboclo sai “atuado” para a brincadeira. Como percorre a pé longas distâncias, por estradas e atalhos, o som dos chocalhos no surrão anuncia, de longe, a sua presença.

“Vem, vem, vem
Fazer parte deste cordão
O Recife tem um lugar
Pra você dentro do coração.”

Como aqui foi registrado, especialmente para a Jangada Brasil (www.jangadabrasil.com.br) o ciclo carnavalesco em Pernambuco é muito rico em ritmos e cores.
Frevo. Maracatu. Caboclinho. Coco. Ciranda. Urso. La Ursa. Papangu. Máscaras.
Que são vivenciados e divulgados para o mundo ao vivo e a cores.
Mas o bom, o bom mesmo, é fazer parte. Ser um na multidão. Se não for este ano, quem sabe no próximo, pois
“Pelas ruas do Recife
Todo ano tem
Quatro dias de folia
E alegria tem
Pra mostrar que o frevo e animação
Marcam o passo no compasso
No mesmo cordão.”


Referências Bibliográficas
* CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro.
* SOUTO MAIOR, Mário e SILVA, Leonardo Dantas. Antologia do Carnaval do Recife.
Recife: Editora Massangana. 1991.
* BONALD NETO, Olímpio. Os Gigantes Foliões em Pernambuco. Olinda: GCI Gráfica e
Editora Ltda. 1992.
* LIMA, Cláudia Maria de Assis Rocha. História do Carnaval. Edição Especial . Ano III.
1998.
* SILVA, Leonardo Dantas. Histórias do Carnaval do Recife. 1998.
* Encarte Cultural Brincantes. 1998.
* Jornais locais: Diário de Pernambuco. Jornal do Commércio. A Folha de Pernambuco.
* Micromonografias da série Folclore. FUNDAJ-Fundação Joaquim Nabuco.


(www.usinadeletras.com.br em 08/02/2003


Publicado no site: O Melhor da Web em 17/01/2009
Código do Texto: 12025 1ª publicação neste blog em 17/01/2009.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

RITMOS MUSICAIS


RITMOS MUSICAIS
Thelma Regina Siqueira Linhares

Músicas há em mim
Frevo no turbilhão das emoções
O compasso diário é ao som do Forró, Xaxado e Baião
Na Ciranda tenho a expressão dos sentimentos profundos
O ritmo fisiológico é no Maracatu e Axé que encontro eco
No Samba sambo, rebolo, embolo
E à noite Cantigas de Ninar embalam os sonhos.

Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos - 51º volume - CBJE - RJ

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

PRESENÇA MASCATE NAS PRAIAS PERNAMBUCANAS


PRESENÇA MASCATE NAS PRAIAS PERNAMBUCANAS
Thelma Regina Siqueira Linhares (*)

O litoral pernambucano abrange 187 km de praias, desde a barra do rio Goiana, na praia de Carne de Vaca (em Goiana na divisa com a Paraíba, ao Norte) até a foz do rio Persininga, na praia da Coroa Grande (no limite de São José da Coroa Grande com Alagoas, ao Sul). A essa extensão de belas praias, algumas urbanas e densamente povoadas, outras quase inexploradas, acrescenta-se o arquipélago de Fernando de Noronha, distante 545 km do Recife e que, com suas 21 ilhotas, de origem vulcânica, emerge em pleno Oceano Atlântico, numa paisagem paradisíaca, reconhecida em todo o planeta.
O Oceano Atlântico, com suas águas mansas e tépidas, banha a costa pernambucana, protegida pela barreira natural dos arrecifes ou recifes, que funciona como um quebra-mar. O nome do estado, de origem tupi, vem de paranã-puk, significando mar furado, alusão ao canal de Santa Cruz, que cerca a ilha de Itamaracá. Enquanto o nome da capital – Recife – decorre dos recifes, bancos de corais e que, já nos tempos coloniais, tinha delineada a vocação de porto, fundamentada na proliferação dos mascates. Inclusive, houve a Guerra dos Mascates que durou de 1710 a 1714, conseqüência da mudança da sede de governo da capitania de Olinda (que concentrava os ricos senhores de engenhos) para Recife (habitada pelos mascates, comerciantes portugueses). O impasse foi resolvido com a permanência do Recife como sede de governo, passando o governador a residir seis meses em cada vila...
As cidades banhadas pelo Oceano Atlântico, seguindo-se o sentido Norte/Sul, totalizam 14 municípios, a saber: Goiana, Itamaracá, Igarassu, Abreu e Lima, Paulista, Olinda, Recife, Jaboatão dos Guararapes, Cabo de Santo Agostinho, Ipojuca, Sirinhaém, Tamandaré (Rio Formoso), Barreiros e São José da Coroa Grande. Alguns municípios fazem parte da Região Metropolitana do Recife, com praias urbanas e de grande densidade demográfica, com a descaracterização das paisagens litorâneas, enquanto outras cidades, embora pólo turístico, apresentam praias ainda inexploradas, refúgios paradisíacos, com extensos coqueirais.
Ao clima tropical, com temperaturas sempre elevadas e poucas variações térmicas durante o ano, associa-se à vegetação litorânea. Nas proximidades da foz de rios, na mistura das águas doce com a salgada, destacam-se as áreas de mangues, berçário para muitas espécies animais. Alguns manguezais estão sendo preservados e repostos. Nas praias, plantas rasteiras e esparsas, cobrem as areias brancas e finas. Na orla marítima, especialmente nas praias mais afastadas dos grandes centros urbanos, aparecem imensos coqueirais. E lembrar que coqueiros e mangueiras, tão bem aclimatados, vieram com o branco colonizador e que disputaram terreno com os nativos cajueiros... Há, ainda, manchas de Mata Atlântica em algumas praias pernambucanas.
Em relação ao relevo, as praias pernambucanas estão, em sua maioria, nas planícies litorâneas ou costeiras, quase ao nível do mar, o que favorece a invasão das águas durante as ressacas, em especial, no mês de agosto, e cuja fúria chega a destruir calçadas, avenidas e diques de contenção. Em alguns e raros trechos do litoral, há praias de falésias, terrenos em tabuleiros que, abruptamente, declinam para o mar, responsabilizando-se por um visual bem diferente, da costa de Pernambuco.
A movimentação mascate no litoral pernambucano é intensa, haja vista, a presença do astro-rei, em quase todos os 365 dias do ano, principalmente nas praias urbanas ou nas de pólos turísticos. E quase tudo é negociado. Comida, bebida, artesanato, serviços etc.
Há os quiosques padronizados, como aqueles que ficam na orla marítima das praias de Recife (Boa Viagem e Pina) e Jaboatão dos Guararapes, por exemplo. Vendem água de coco, lanches, cartões de telefone público, fichas de chuveiros dos calçadões, postais, artesanato e outros souvenir. Há as barracas com cobertura de palhas de coqueiro na beira-mar e que funcionam como verdadeiros barzinhos, onde a culinária típica, à base de peixe e frutos-do-mar é regada a cerveja gelada e refrigerantes, muito comum nas praias de Olinda, Paulista e Itamaracá. Há os barraqueiros instalados nas areias das praias urbanas disponibilizando serviços personalizados e com espaço geográfico previamente definido. Cadeiras-espreguiçadeiras, guarda-sol, banquinhos, lanches rápidos, cervejas, caipirinhas, refrigerantes etc. Diariamente, essa infra-estrutura é trazida à praia em carroças empurradas pelo próprio barraqueiro ou em kombis e caminhões, dependendo do poder aquisitivo do mesmo. Alguns terceirizam os serviços, têm uma grande equipe de apoio, que chega a envolver famílias. Identificam-se por nomes ou siglas e usam camisas ou camisetas uniformizadas. Se não têm o pedido do cliente, buscam entre os concorrentes o produto desejado. Afinal, prevalece aquele conceito de que quem manda é o freguês.... E há aqueles ambulantes, literalmente. Empurrando carrocinhas, equilibrando caixas térmicas ou de isopor, baldes, bacias, sacos, varas nos ombros, vão oferecendo seus produtos aos banhistas e turistas. Às vezes, no gogó, chamando atenção com pregões simples. Às vezes, chegando perto do cliente, insistindo. Destaque especial para alguns pregões que um ouvido atento pode captar em minutos:
"Camarão, camarão. Um é três; dois é cinco!".
"Chegou tradicional... casquinho (de caranguejo) chegou".
"Só original! Quer brilhar?" (para boné com lantejoulas).
"Olha ostra, ostra!"
"Olha a batatinha, olha!"
"Bronzeador... bronzeador... bronzeador."
"Olha o amendoinho!" (para amendoim).
"Bolsa. Bolsa e chapéu."
Nem todo produto é 100% confiável, mas sempre tem um freguês que se agrada da mercadoria. E, como é diversificada! Cangas, saídas de banho, chapéus, bonés e viseiras. Protetores solares e bronzeadores. Óculos escuros. Bijuterias. Artesanato em barro, palha, tecido, conchinhas, ostras e materiais reciclados. Quadros. Raspa-raspa geladinho. Sorvetes e picolés de grandes e pequenas indústrias. Água de coco. Frutas da época (abacaxis, mangas, jambos, melancias etc). Saladas de frutas. Queijo assado. Cachorros-quente. Espetinhos de diversos sabores. Sanduíches variados e naturais. Bebidas ao gosto do freguês: cachaça, caipirinha, cerveja, refrigerantes. Toda sorte de frutos-do-mar: caranguejo, camarão, caldeirada, bobó de camarão, moqueca de camarão e de peixe, ostras etc. Caldinhos diversos. Ovos de codorna. Amendoim. Algodão doce. Batatinha-frita. Pipas e cata-ventos para deleite da garotada. Bexigas plásticas com bolas de soprar. Brinquedos infláveis. Periquitos australianos. CDs e vídeos piratas. Repentistas e violeiros para apresentações ao vivo. Folhetos de cordel. Cartomantes. Fotógrafos.
Num fim-de-semana ou num feriado é muito dinâmica a presença mascate nas praias pernambucanas, que o banhista ou turista pode conferir. Sem precisar sair debaixo da sombra do guarda-sol, enquanto toma uma refrescante água de coco, joga conversa fora e aprecia a bela paisagem de céu, sol e mar. Ainda, com direito de visualizar uma lancha ou jangada em alto-mar, um ultra-leve cortando o ar e pipas colorindo o azul do céu. Dá para recarregar as baterias emocionais do stress cotidiano em tão democrático lazer.
Bom mesmo é participar. Fica o convite.

(*) Professora e Pesquisadora de Folclore.
Recife/PE
novembro de 2005

Colaboração da autora à Jangada Brasil
http://www.jangadabrasil.com.br/revista/outubro95/of95010c.asp

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

NÃO CUSTA NADA



NÃO CUSTA NADA (*)
Thelma Regina Siqueira Linhares


Não custa nada:
Ser gentil.
Sorrir.
Pedir.
Agradecer.
Dar passagem...
Ser ponte.

Não custa nada:
Vivenciar
pequenos e antigos valores
minimizados e deletados
no corre-corre do dia-a-dia.


(*) III Concurso de Poesia da Biblioteca Gilberto Freyre . SESC Santo Amaro - Recife/PE. Prêmio Joaquim Cardozo (3° colocado). 14/12/2007.